domingo, 25 de janeiro de 2009

Memorias 1

Corri mundo…conheci homens, mulheres, presidentes, príncipes, reis, rainhas, bandidos, anjos, padres, demónios…comi bichos, plantas. Vi coisas estranhas, chocantes, inacreditáveis, brutais… Senti coisas boas, más, horríveis. Estive em festas, guerras, palácios, tendas, hotéis, casas, barracas. Estive no inferno, no céu, debaixo de terra, no mar, no ar, na selva, no deserto, no paraíso…E agora estou aqui com uma glock 17 encostada na testa por um olhar vazio de 12 anos…
Os guarda-costas, hoje conhecidos simplesmente como “seguranças” - numa abreviação do que deveria ser “agente de segurança pessoal” - são figuras presentes há muito na história da humanidade. Sendo esta uma profissão muito discriminada, a segurança pessoal tem a fama (e demasiadas vezes o proveito) de ser um trabalho para pessoas de pouca inteligência; supostamente, o homem mais inteligente contrata o mais forte, e consequentemente menos inteligente para protegê-lo. E ficou assim estabelecido o estereótipo do segurança “forte e burro”. Mas a verdade é que a profissão nem sempre foi assim discriminada. Os “protectores” da Mesopotâmia e a guarda pretoriana de Roma eram considerados uma casta de elite, da qual somente os mais preparados e nobres guerreiros faziam parte. O melhor exemplo de prestígio, porém, vem do Japão feudal, da época dos samurais, em que os yojimbo, membros da elite samurai encarregada da proteção do senhor feudal, eram os melhores e mais respeitados entre os melhores guerreiros. Dentro do código de honra dos samurais, o bushido, falhar para com o seu senhor era motivo para cometer o suicídio. Para os yojimbo, caso viessem a falhar e seu senhor fosse morto, depois de vingarem a sua morte deveriam também cometer o seppuku, ou seja, suicidar-se, abrindo seu ventre com a espada curta.Como podemos entender o código de honra samurai nos tempos modernos? Será que os seguranças de hoje seriam capazes de dar as suas vidas pela dos seus “senhores”,dos seus clientes? Na maioria das vezes, não existe respeito algum entre contratante e contratado, salvo algumas excepções, que felizmente já tive oportunidade de experimentar, onde senti verdadeiro respeito e admiração da parte da pessoa que protegia. Mas a idéia do sacrifício não se trata de adoração pelo cliente, ou de mera hipocrisia para valorizar a função do guarda-costas. A meu ver o caráter de sacrifício inerente à função do segurança, na medida em que ele arriscaria, e arrisca, sua vida, para garantir a segurança da pessoa que protege, é uma questão ética. A ética é um conceito difícil de ser explicado, mas basicamente é o sentimento mais puro e simples de discernir o bem do mal, o certo do errado. Aplicada à função do guarda-costas, portanto, a ética indica claramente que, se a função do segurança é proteger o cliente, é a vida deste, e não a do guarda-costas, que é a prioridade. Não é hipocrisia, repito, dizer que o guarda-costas daria a sua vida pela do cliente; se ele o faz, não é pelo cliente, mas por si próprio, uma vez que como profissional sério, a ética leva a arriscar-se para proteger o cliente em detrimento de sua própria segurança. O verdadeiro profissional não suportaria viver com a vergonha de ter falhado, tal qual os samurais de outrora. Enfim, profissionalismo, ética e honra são conceitos que precisam ser reavaliados na sociedade moderna.